Uma viagem de trem
Na falta do que fazer, passo dias e mais dias, para não dizer todos os dias - sem fazer nada.
Nada de nada, mano. Lembrando sempre que nada é nada, como ensinavam os poetas de antigamente. Se bem que, na verdade, como diriam os santos, não se pode dizer que os poetas de antigamente viviam também tão preocupados assim com as verdades.
Na verdade, e na maior parte dos casos, a verdade, ou as verdades existiam ou só existem mesmo para quem vai atrás dela. Como nunca ninguém soube, de verdade, onde está a verdade, fica difícil a gente procurar por ela. Essa é a grande verdade, mano. Afinal, o que é a verdade, você sabe? Eu falo da verdade verdadeira, a verdade nua e crua, doa a quem doer, como costumam dizer os mais sábios e evoluídos.
" Saudade de verdade "
Como não sou nem sábio e nem tão evoluído assim, melhor passar de lado, ou passar de banda, como dizem os caboclos, para não esbarrar em alguma mentira.
Em verdade e de verdade - eu falo das minhas verdades - passei a vida inteira, pelo menos até agora, correndo atrás de coisas para fazer. Primeiro estudava muito pouco (agora estou falando a verdade dizendo que estudava pouco), e só estudava quando os professores exigiam, noves-fora quando pai e mãe apertavam - "Digaí a verdade, não minta!". Eu nunca aprendi a mentir. Uma ou outra vez, talvez, uma mentirinha ou duas, absolutamente improváveis, não mais que isso. Na verdade, falando e escrevendo quase toda a minha vida, adoro a verdade. E é verdade.
" Mais um pouco "
Nada como a verdade - penso eu e com certeza pensa você, meu caro leitor. Verdade a gente fala onde tiver que falar, diante de quem tem que ouvir - para não resmungar depois - dizendo que ouviram mal. Mano, meu caro mano, a verdade é a verdade. Por mais que doa. A verdade dói na hora que entra na cabeça da gente para nunca mais sair. Tanto é verdade, claro, que, com certeza, o ilustre leitor também pensa assim.
Claro, também, que ela sempre vem, quando a gente manda ver uma mentirinha dessas bem mentirinhas mesmo, por exemplo, aquelas que a gente usa, às vezes, do tipo estacionar o carro num local proibido.
" É batata! "
Pois é. Na falta do que fazer, dia destes resolvi descascar batatas. Isso mesmo, caro amigo, descascar batatas. De alguma maneira estava dando uma volta ao passado, nos tempos em que fui selecionado para "Servir ao Exército"! Na primeira frase já foi repreendido pelo computador que garante que a expressão está totalmente errada. Na verdade, fui incorporado ao Exército brasileiro. Não é assim que se diz? Se é ou se não é, fica sendo. Até porque tudo isso já foi e, repetindo, fui incorporado ao Exército Brasileiro, como se costuma dizer. E se não é assim que se diz, fica o dito pelo dito. E aqui não se trata do Dito, que foi um grande amigo lá nos tempos do tal "Segundo G-Can 90", do glorioso Exército Nacional, quartéis localizados em Quitaúna, município que abriga quartéis do Exército.
Para não deixar o leitor ressabiado, esclareço que fui buscar esta história nos tempos em que eu também andava fardado, verde-oliva, por aí. E esse aí, tem que soar como dor. Afinal, estamos falando de um soldado do glorioso Exército Brasileiro. Pobre do elemento, ou do soldado que fosse flagrado sem farda pelas ruas. Soldado tinha que andar fardado.
Menos mal que eu servi ao Exército por lá, em Quitaúna, onde a gente chegava preferencialmente com o trem chamado de "Trem Militar", que partia da Estação Júlio Prestes, da antiga Estrada de Ferro Sorocabana. Alguém lembra da Sorocabana? Nossa, quanta saudade! A Sorocabana levava e trazia passageiros tanto de regiões mais próximas, quanto das mais longínquas.
" E lá vinha o apito do trem "
Quem servia ao Exército, não podia vacilar. Perder o trem militar, que era de graça, claro, obrigava a viajar nos trens de carreira, que circulavam no subúrbio paulistano. Muita gente provavelmente nunca tinha ouvido falar do tal trem militar, mas ele existiu. Nem sei se circula ainda hoje, muito menos como os militares que servem à Pátria lá em Quitaúna fazem hoje.
Talvez eu devesse sair por aí perguntando coisas e mais coisas. Mas, as coisas e mais coisas daquele tempo, provavelmente hoje já não representam coisa nenhuma.
Para o bem ou para o mal sinto uma saudade danada porque nunca mais andei de trem. Sou eu que levo os trens da Sorocabana na memória por toda saudade que deixaram em mim.
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