Terça, 07 Out 2025

Vou andar e depois eu conto

Tava dando uma procurada nas coisas mais velhas e já encostadas quando, de repente, dei de olho com um sapatão velho que eu tanto gostava, tanto usava, tanto caminhava, tanto procurava.

Sapatão que ia comigo pra tudo quanto é canto. Sapatão que só tinha um inimigo, um outro sapatão. A diferença é que este sapatão é e sempre foi marrom ou coisa parecida, e o outro, que tem e sempre teve as mesmas características, é preto.

Ah! O quanto eu andei com esse coitado.

Coitado não, ele era o meu companheiro. Ele me suportava, do jeito igualzinho que eu o suportava.

Nossa, como a gente andou. E sempre juntos. Dias e noites, na cidade e nos campos, nas salas de aula, na minha vida, enfim, já que, naqueles tempos que dão tanta saudade, eu saia daqui da cidade de Atibaia antes do dia amanhecer totalmente, ali pelas seis da manhã e ia direto para São Paulo, onde dava aulas nas Faculdades Integradas Alcântara Machado - FIAM -, que ficam ou continuam ali no bairro da Liberdade e no bairro do Morumbi, em São Paulo.

" Tanta gente formada "

Faculdades que já formaram e prepararam tanta gente que hoje cumpre o sagrado ofício de auxiliar os que precisam, seja em casos de Direito, seja em casos de Medicina, seja em casos até de Economia. Tanta gente foi formada, essa e tanta gente que anda por aí, salvando, ajudando, julgando e sei lá mais o quê. Gente da FIAM.

Era uma delícia esse tempo. Pelo menos três dias da semana sair daqui, de Atibaia, ir para a Capital, São Paulo, chegar nos prédios da Faculdade, fosse no bairro da Liberdade, fosse no bairro do Morumbi, já que as FIAM mantinham seus alunos em vários prédios.

" Indo e vindo "

Repito, que delícia.

Manter contato com a garotada, quase moçada, fosse no centro da cidade, fosse no Morumbi, já citado, onde as aulas aconteciam.

Ia e vinha, vinha e ia, quantos quilômetros eu encarei pela Rodovia Fernão Dias, dia amanhecendo e dia anoitecendo ou, até quase meia-noite, desse dia ou desses dias. Encarando, cara-a-cara, tantos rapazes e moças que estavam ali nas faculdades, preparando-se para suas vidas futuras.

E como eram legais. Como era gostoso encarar aqueles meninos. Hoje eu fico diante da televisão e vejo vários deles até nas câmeras das emissoras de televisão, divulgando notícias, falando, criticando, defendendo o povo, ofendendo, quando é o caso, os governos que enganam mais que a enganação.

" Saudade "

Saudade sim.

Por mim, eu jamais teria parado. Estaria lá até hoje. De manhã ou à noite, falando e pondo pra fora tudo o que sei, tudo o que aprendi, tudo o que eu vivi com o Jornalismo, com tudo o que eu passei durante tanto tempo como jornalista. As pessoas com as quais cruzei. Reis, rainhas, presidentes, vices, políticos do mundo em geral, dos padres, madres, bispos, arcebispos e até o Papa.

Jornalista vê tudo, pergunta tudo, conta tudo, vive tudo para depois sentir saudade de tudo.

Jornalista quer sempre que a vida nunca se acabe. Que os problemas estejam sempre aí para serem denunciados. Jornalista vive o mundo, focando ladrões, traficantes, governantes, mandantes e desmandantes, desses que se julgam os donos de tudo, muitos deles bandidos, que ficam por aí, explorando os que sofrem.

" E como dói! "

Acreditem, também dói ser jornalista.

E muito. Muito mesmo.

Porque jornalista, sempre que pode, está diante do que presta, mas, principalmente nesse mundo todo, fica diante do que não presta, diante de safados, bandidos, políticos ou não, gente que não serve nem para ser gente.

Só que jornalista é gente e denuncia essa gente que vive às custas do sofrimento das gentes.

Vivi muitos anos nas ruas atrás de notícias, buscando informações, olhando a bandidagem de perto, enaltecendo aqueles que vivem para salvar, aqueles que vivem para o bem, aqueles que já são o bem em pessoa.

É gostoso ser jornalista. A gente vibra como jornalista. A gente ri como jornalista, mas, especialmente, a gente chora como jornalista. Porque jornalista vive quase todas as coisas que andam por aí. Especialmente as coisas ruins que precisam ser denunciadas. Que precisam ser curadas, que precisam ser mudadas. Tanto aqui na terra dos normais quanto nos poderes que ficam lá em cima e que vivem às custas dos pobres sofredores.

" Um choro, como não? "

Jornalista chora mais do que ri. Não é fácil ver o mundo bem de perto, o mundo que castiga, esse mundo que faz um mundo inteiro de gente sofrer. Sei lá.

Isso mesmo, sei lá. Ou sabe-se lá. Sabe-se lá o que pensam os que estão lá em cima, por cima, mandando e desmandando, na boa vida, no melhor das vidas, às custas dos que vivem aqui em baixo, trabalhando, se ralando, se arrastando, se doendo para conseguir sobreviver.

" O sapato "

Danado de sapato marrom e tão gostoso, tão velho quanto eu, que tanto andou comigo nessas intrigas humanas que não param, pois o ser humano também não para. Não para de trabalhar, não para de sofrer, não para de querer, não para nem para nada.

Tem uns que bebem para esquecer da vida, tem outros que vivem sem se lembrar da fome, tem uns que nem vivem, só andam por aí, porque a vida é uma andança.

E, se a vida é andança, vamos em frente companheiro. Já coloquei meu sapato velho nos pés e me sinto no ontem. Acho que o ontem era melhor que hoje.

Será que não? Vou andar no meu sapato velho e depois eu conto.

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Quarta, 08 Outubro 2025

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