Seu filho pode ser o seu futuro
Não posso dizer que já rodei o mundo inteiro, longe disso, mas uma coisa eu garanto: já voei pra burro. Já fui pros states, pras oropas, pro Japão, pro outro lado do mundo, pra Bahia, pra Cuba, Venezuela, fui até pro Piauí velho de guerra, mais largado que o Cunha nesta altura do campeonato, justo o Cunha, aquele que mandava tanto que mandou a Dilma praquele lugar. Lembra? Pois é, já viajei um bocado e continuo viajando. Viajo até na maionese, como se diz por aí, embora nem desconfie onde fique essa tal maionese. Alguns dizem que foi o Lula quem inventou essa coisa de viajar na maionese. O Lula é mesmo um viajante, nunca está em lugar nenhum.
Apesar de tudo isso só agora, nesta última viagem que fiz ao Uruguay e Argentina foi que descobri as diferenças entre Executivos e executados. Executivos são os caras, meu caro. Os caras que mandam e não pedem. Dão ordens com o olhar. Vivem cercados de um monte de servidores, os tais executados, que fazem e cumprem todas as suas ordens num piscar de olhos. Quando algum executado mais puxa-saco vai além e faz mais do que o Executivo exige vira farinha. Executivos gostam de dar ordens. Se o executado cumpre uma ordem que ainda não recebeu, está descumprindo a lei e a ordem imposta pelo Executivo e aí o Executivo executa o executado.
"o Executivo executa"
Só aprendi isso agora quando recebi passagens de avião, reservas em hotéis, reservas no tal do Buquebus, que é um navio, um buque, que sai da Argentina e vai para o Uruguay e vice-versa, sendo que, nas pontas, tem um ônibus, o tal do bus, esperando pelos passageiros para levá-los até o centro da cidade demandada. Minha viagem teve avião, o Buquebus, hotéis, tudo VIP, tudo Executivo. Nunca me imaginei um Executivo.
Para reforçar meu debut nessa classe rara de Executivos, ainda viajei pela Qatar, eleita por quem entende do assunto, como a melhor empresa aérea do mundo. Cheguei ao aeroporto, em Guarulhos, como se fosse um executado, sujeito que trabalha feito um camelo e recebe feito um cão: migalhas. Que paga todos os impostos, quase sempre cumpre todas as leis, segura todos os rojões, mantém o sistema funcionando através dos citados impostos que são postos sem que ninguém possa se queixar sob pena de acabar em cana. Resumindo: Executivo manda, Executado obedece. Percebeu? Pois é, o executado é o povo.
Mas, então, fui lá para a área de chek-in, como eles dizem e entrei numa fila enorme. Foi quando um funcionário da Qatar viu minha passagem. E disse: "Perdão, mas o senhor não deve ficar nesta fila. Venha comigo". Fui. Minha mulher ao lado. Quando a moça do balcão também viu nossas passagens, só faltou chorar de tanto rir, ou rir de tanto chorar. Em dois minutos despachou minhas malas, me liberou, me libertou, me orientou e me deu um papel todo cheio de lero-lero, informando que esse dito cujo papel daria acesso ao lounge. Não sabe o que é lounge? Lounge é o tudo de bom. Mais que um bar, mais que restaurante, é um ambiente. Coisa de rei, meu rei. Decoração muito fina. Sofás, mesas baixinhas e tal e coisa. Eu era um VIP - "Very Importante Person" e não sabia.
"era tudo de bom"
O tal lounge tinha umas 3.800 e uma geladeiras com cervejas de todo o mundo, tudo quanto é refrigerante, tudo quanto é água, os whiskies mais caros e mais velhos possíveis. Comida nem se fala, tira-gosto, põe-gosto, vinhos mais estrangeiros que os franceses e italianos com muitos executados para servir tudo. Se bem que o Executivo também podia se servir à vontade naqueles balcões de mármore e depois sentar-se a uma mesinha exclusiva. Garçons e garçonetes serviam à "voluntê", como se diz na gíria. Coisa de filme americano.
Aquele papel que a Qatar deu me transformou. Tentei me comportar como se tudo aquilo fosse normal. Pelo menos era assim que se comportavam os outros Executivos que estavam por lá, esperando a hora de embarcar.
Nem sei como (rsrsrsrs) fui forçado a beber dois goles (dois bons boles, diga-se) de Chivas Reagal, 21 anos (custa quase uma passagem de avião). Depois comi uns lero-leros, coisas "qui nóis num intende nada", como diriam os manos. Me entupi. Foram quase duas horas de horror, tanta comida fina, tanta gente servindo, tanto Executivo andando, eu no meio, Executivo também.
Na hora do embarque tentei escolher a menor das filas, até ler um aviso: "Classe Executiva". Ninguém na fila. Meio ressabiados eu e minha mulher nos aproximamos e aprendemos: Executivo não fica em fila. A moça do atendimento nos levou direto ao avião. E como era Executivo, entramos pela porta exclusiva, enquanto os outros executados ficavam se apertando nas filas da porta ao lado, se bem que bem distante. Sim, os aviões têm portas exclusivas para os Executivos. E têm espaço especial. Não contei, mas no lugar onde estavam vinte Executivos, eles enfiariam sessenta ou setenta negos. Isso lá na tal classe aonde vão os executados. Conheço bem, toda a minha vida viajei como executado. Nunca sonhei que um dia seria Executivo.
"mais um whiskezinho"
Mal sentamos veio uma moça toda paramentada, vestida de "Qatar", e perguntou: "O senhor aceita uma bebida? E a senhora?". Isso num inglês absolutamente ininteligível porque a moça, igual às outras moças que nos atendiam, falava um inglês pior que o meu e um indonês, ou sei lá a língua que se fala na Indonésia, de onde saíram, confessadamente essas moças. Tudo isso misturado com um pouco de árabe, pois acredito que se fale árabe lá no Qatar ou coisa parecida. E eu que já havia tomado duas doses daquele Chivas, pedi mais uma. Tudo para esquentar as turbinas. Do avião, claro.
As poltronas Executivas dos aviões são inconfessáveis. Difíceis de explicar ou definir. São poltronas reais, ou realmente poltronas. Se transformam em uma cama, quando o Executivo assim o desejar. Da mesma forma que se transforma em uma simples cadeira. Fazem massagem nos pés, nas pernas e até no bumbum. Executivos recebem cobertores, um chinelinho encantador para não cansar os pés e toda a atenção possível. Almoça ou janta com um cardápio internacional. Na tal classe Executiva só falta eles voarem por você, no mais se tem tudo.
E, de tudo em tudo foi assim que cheguei a Buenos Aires. Nada daquele atropelo de gente burramente querendo descer primeiro do avião, afinal, Executivo tem saída exclusiva pela porta da frente. Tudo vai bem até que tudo se iguala de novo, Executivos e executados têm que encarar as filas para entrar no país vizinho. Se bem que existam os Executivos mais Executivos do que os grandes Executivos que contam com alguém à sua espera. Esses são conduzidos como mais Executivos ainda fora das filas e tal e coisa. Todo mundo tem que mostrar documento. E a fila é grande para os executados e Executivos de segunda linha (ou de terceira, como foi o meu caso).
"virando executado"
Quando vi, estava na Argentina, já como um executado. Um dia em Buenos Aires e fui para o tal do Buquebus que me levaria até Montevidéu. O Buquebus também tem lugar para Executivos, com direito a passear e sonhar nos Duty-Frees da vida, vinhos, cervejas, whiskies, brinquedos, roupas, tudo do melhor do mundo a preço de dólar. Doeu, pois eu só "estava Executivo" por algumas horas. Na verdade não passo de um executado como você, meu caro leitor. Antes que me esqueça, fui até Montevidéu e voltei para Buenos Aires, como Executivo na mordomia de sempre. De lá para cá, o sonho acabou no terminal de chegada do aeroporto de Guarulhos.
Nesse tempo todo não me saía da cabeça que, se uma passagem de Executivo, produz tanta coisa, tanto status, tanto glamour, imaginem a vida que levam as Dilmas, os Lulas, senadores, deputados essa caterva que vive às nossas custas E nós pagamos tudo para essa cambada.
Detesto ser executado. E você?
P.S.: Faltou explicar o principal: toda essa aventura de Executivo foi paga pelo meu filho, Júnior, só porque eu e a Ana Maria fazíamos aniversário. Viu como vale à pena investir nos filhos? É lucro certo no futuro.
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